Os desafios e as oportunidades do blockchain nas empresas

É uma das buzzwords do ano: 2017 trouxe a afirmação do blockchain enquanto tecnologia que tem capacidade para transformar a forma como as organizações trabalham e se relacionam com os seus parceiros. Se do lado das criptomoedas o blockchain já é uma tecnologia bastante explorada, do lado empresarial ainda estão a ser dados os primeiros passos na adoção de um sistema que muitos acreditam poder ser tão influente como foi a web na década de 1990.
O blockchain, também apelidado de distributed ledger, é em traços simples uma base de dados descentralizada, querendo isto dizer que existem várias cópias da mesma espalhadas por diferentes máquinas e cuja informação é atualizada em tempo real. Além disso, o blockchain assenta no conceito de rede imutável, querendo isto dizer que o que fica registado nesta base de dados não pode ser alterado posteriormente, o que traz uma grande transparência e segurança ao registo de informações.
No evento Blockspot Conference, realizado ontem em Lisboa, os especialistas defenderam que a tecnologia está a entrar na sua fase de maturidade, pelo que só agora é que está a ser verdadeiramente considerada como uma hipótese viável na concretização de projetos por parte das empresas. Apesar do momentum positivo vivido, ainda existem desafios que precisam de ser endereçados para que possamos ver uma adoção mais massificada do blockchain.
«Ganhar escala é o Santo Graal do blockchain e atualmente nenhuma tecnologia de blockchain é escalável – estou a falar de várias transações por segundo», exemplificou o diretor executivo da Etherify, Justin Wu. O norte-americano comparava as três ou quatro transações por segundo que algumas redes de blockchain para pagamentos aguentam, enquanto sistemas mais robustos como a Visa fazem milhares de transações por segundo.
«Ninguém vai colocar serviços críticos no blockchain enquanto o blockchain não garantir a capacidade de escalabilidade necessária», acrescentou Justin Wu.
Apesar de esta ser uma realidade inegável, a falta de escalabilidade em várias tecnologias de blockchain, também é verdade que nem todas os projetos criados neste ambiente precisam de uma estrutura tão robusta.
“Estamos a começar a uma era em que temos estas plataformas a entrar nas suas versões estáveis. Já temos plataformas que nos permitem endereçar algumas soluções, não ao nível da Visa e do Mastercard, (…) mas temos de pensar que existem milhões de aplicações que não precisam deste tipo de volume”, defendeu o diretor executivo da subsidiária portuguesa da IntellecEU, Paulo Rodrigues.
Opinião que foi partilhada pelo diretor executivo da EasyPay, Sebastião Lancastre. «99% das soluções não precisam de um tamanho tão grande de dados para serem processados”, defendeu, para depois acrescentar: “Sim, podemos começar hoje [a trabalhar em blockchain], vamos passo a passo, é assim que todos nós fazemos negócio».
Vantagens competitivas
Uma das razões que está a levar à adoção do blockchain nas empresas é a capacidade que tem para diminuir custos administrativos. Dependendo da rede de blockchain em questão é possível explorar os chamados contratos inteligentes [smart contracts na versão em inglês], mecanismos que executam tarefas automáticas assim que a veracidade dos dados é confirmada por meio da base de dados distribuída e imutável.
Por exemplo, a seguradora Axa está a aplicar o blockchain à área dos seguros para viagens de avião – se um voo atrasar duas horas, então é imediatamente feita a devolução do dinheiro aos clientes. Este processo é feito de forma automática por via de smart contracts, dispensando assim qualquer ação humana na resolução do problema.
O lado apelativo dos smart contracts já colocou a Huub, empresa de logística, a olhar para o blockchain como uma forma de resolver alguns dos seus desafios de negócio. Luís Roque, diretor executivo da empresa, disse que já houve situações em que o contentor com os produtos chegou mais depressa a Portugal do que a papelada necessária para fazer o levantamento da mercadoria – algo que não ocorreria se já houvesse uma implementação de smart contracts entre todos os parceiros envolvidos.
“Estamos prontos para começar a testar e a criar alguns pilotos. (…) Principalmente tens de garantir a segurança da plataforma e que todas as partes envolvidas estão comprometidas com as plataformas nas quais colaboram”, salientou o CEO da Huub.
Maior automatização, mais rapidez nos processos, maior transparência e maior segurança são algumas das vantagens diretas que as empresas podem extrair do blockchain. Para Justin Wu, a tecnologia pode inclusive servir para mudar a forma de voto nas tomadas de decisões nas empresas ou até na distribuição de tokens – ativo digital associado à rede de blockchain – como uma nova forma de ações. “O blockchain vai ser a autoridade central nas relações das empresas”, referiu.
Se por um lado o blockchain faz todo o sentido na agilização de processos de algumas organizações, por outro é importante que os decisores de negócio não caiam no erro de quererem investir no blockchain só porque sim. Paulo Rodrigues deixou o aviso.
“As empresas precisam de entender o que é o blockchain. Muitas empresas leem, entram em modo de pânico porque não estão a apostar no blockchain, mas é preciso perceber se faz sentido na sua área. Imutabilidade, consenso entre diferentes nós, são tudo conceitos que as empresas devem perceber”, considerou o porta-voz da IntellectEU Portugal.
“Primeiro percebam o que é, depois olhem para os vossos negócios e vejam onde pode ser aplicado”, sublinhou.
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