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Disseram-lhes que o mercado de CRM estava saturado. Provaram que todos estavam errados

Publicado em 22 Novembro 2017 por Ntech.news - Rui da Rocha Ferreira | 3109 Visualizações

Pipedrive Martin Henk

Ferramentas de gestão de relacionamento com o cliente, vulgarmente conhecidas como CRM. Este é um mercado que existe há anos, que já tem empresas bem estabelecidas e que parecia tudo menos interessante para uma empresa jovem.

Mas onde outros viram um terreno pouco fértil, a Pipedrive viu uma oportunidade para se transformar numa marca global. Passados sete anos da sua fundação, a Pipedrive é uma das grandes empresas mundiais de CRM: tem mais de 50 mil clientes espalhados por 140 países.

Os números são um bom cartão de apresentação desta empresa oriunda da Estónia. Agora por cada cartão novo que der aos seus clientes, a Pipedrive também vai dar um pouco de Portugal. No início do ano a tecnológica decidiu abrir o seu terceiro escritório, tendo escolhido Lisboa para esse investimento.

Em setembro, o Ntech.news sentou-se o diretor de desenvolvimento de produto da Pipedrive, Martin Henk, para falar sobre esta aposta da empresa.

Ficámos a saber o porquê de terem escolhido Lisboa, os planos que têm especificamente para o centro de operações de Lisboa e também para o mercado português, assim como a visão da tecnológica a médio prazo. “Queremos ter centenas de milhares de clientes em todo o mundo, queremos ser mais globais”, projetou Martin Henk durante a entrevista.

Ntech.news: Provavelmente já respondeu a esta questão várias vezes, mas vamos fazê-la na mesma: de todos os países do mundo, português escolher Portugal e Lisboa para o vosso terceiro escritório?

Martin Henk: Por várias, várias razões. Sentimos que precisávamos de abrir um novo escritório focado em desenvolvimento. A Estónia é um país muito bom, mas é pequeno. A nossa fasquia para o talento é muito alta e queríamos ser capazes de contratar os melhores programadores de forma rápida.

Sabíamos que precisávamos de abrir outro escritório. Olhámos para todos os suspeitos do costume, sobretudo na Europa ocidental, e sentimos que todos estes sítios já estavam demasiado saturados. Já há tantas empresas de outsourcing, que é difícil de conseguir talento.

Nenhum destes sítios nos pareceu tentador. A determinado ponto, provavelmente por causa do Web Summit, começámos a olhar para Lisboa e simplesmente fez-se o clique.

Pareceu realmente um bom local para programadores, mas ainda não há muitas empresas de outsourcing a secar o mercado. Pareceu mesmo um bom sítio em termos geográficos, pois está entre Tallinn e Nova Iorque, onde estão os outros nossos dois escritórios, o que torna Lisboa uma ponte.

A língua portuguesa também é importante para nós, pois temos milhares de clientes no Brasil. Damos apoio em português e isso foi importante. Temos muitas pessoas portuguesas já a trabalhar connosco em Tallinn, sabíamos que são boas pessoas e gostamos delas.

Todas estas coisas fizeram sentido para nós e quando viemos cá pelo Web Summit, vimos a cidade, vimos as pessoas, todos foram bastante prestáveis, as pessoas falam bom inglês e esse não é o caso na maior parte dos sítios, especialmente no sul da Europa.

Também foi estranho, pois assim que descobrimos Lisboa como uma possível opção, começámos a ouvir a palavra Lisboa em todo o lado, todos falavam dela. A um dos nossos investidores em Nova Iorque perguntamos ‘Se pudesse abrir um escritório na Europa, onde seria?’ e ele imediatamente disse ‘Lisboa’.

Todos os jornais estavam a escrever sobre Lisboa e estava constantemente a aparecer.  Depois de cá virmos, apaixonamo-nos pela cidade. É uma resposta longa, mas sim, várias razões.

O Brasil teve um peso importante na vossa decisão. Quão grande é o Brasil para a Pipedrive?

É o nosso segundo maior mercado. Os EUA são o maior mercado e o Brasil aparece na segunda posição.

Pretendem aproveitar a presença em Portugal para conseguirem mais clientes no Brasil?

Sim. Já temos uma equipa de vendas a trabalhar a partir daqui e que está a ter impacto nas vendas no Brasil. Temos uma equipa de suporte a apoiar o mercado brasileiro.

Que outros mercados pretendem atacar a partir de Portugal?

Todos. A Pipedrive é mesmo uma empresa global. Somos muito mais globais quando comparados com o típico fornecedor SaaS. Apostámos muito cedo na internacionalização e temos clientes em mais de 140 países.

Quando abrimos um escritório e damos suporte a partir desse escritório, tentamos assegurar o mundo inteiro. Aqui, por causa do fuso horário, vamos conseguir cobrir muito melhor as Américas, temos muitos clientes nos EUA, México, Canadá e também na América do Sul. Estamos a apoiar todos esses países a partir daqui. Obviamente, a União Europeia e o resto do mundo também.

Não fizemos ainda muito na Ásia até agora, mas isso vai mudar no futuro próximo. Vamos ver.

Tencionam abrir um escritório mais próximo da Ásia?

Não posso confirmar por agora, mas também não o descartaria por completo. Vamos ver.

Relativamente a Portugal, o objetivo era contratar 50 funcionários em 2017 e 100 até ao final de 2018. A questão é: estamos bem encaminhados para esses números?

Sim, estamos. Neste momento já temos 30 pessoas a trabalhar e estamos em linha para atingir 50 até ao final do ano. O escritório está a começar a ficar cheio, mas ainda temos umas secretárias vazias, mas já temos pessoas a chegar.

No curto prazo provavelmente terão de mudar de escritório.

Em dezembro vamos ter um escritório muito maior no mesmo edifício, vamos expandir.

Relativamente aos números de contratações, este ainda é o plano ou a aposta está a correr melhor do que o esperado e tencionam contratar mais pessoas?

Cem pessoas é o mais rápido que podemos ir, penso que esse ainda é o plano. O novo escritório será muito maior, mas também não vai aguentar muito mais do que 100 pessoas. É um bom plano, vamos fazer isso, provavelmente não mais, nos próximos dois anos.

Disse que também vieram para Portugal por causa dos bons profissionais que cá existem. Foi fácil contratar estas 30 pessoas? Existem muitas outras empresas tecnológicas que também estão a contratar – foi fácil? Como conseguiram contratar 30 pessoas tão rápido?

É sempre difícil contratar pessoas, mas penso que tivemos sorte. As primeiras pessoas que contratámos foram profissionais de recursos humanos muito bons. A nossa responsável de RH e o nosso primeiro recrutador são os dois fantásticos.

Também tivemos muita sorte com a imprensa, tivemos bastante cobertura quando abrimos o escritório, muitas pessoas souberam de nós através dos media e tentámos tomar conta das nossas pessoas e os primeiros que contratámos espalharam a palavra sobre as condições de trabalho e sobre como tratamos as pessoas.

Tudo isto combinado fez com que estivessemos em destaque, não tivemos quaisquer problemas, está 50/50 entre programadores e contratações para suporte ao cliente. Os perfis são diferentes, mas sim, temos conseguido encontrar pessoas.

Estão conscientes de que vão ter de lutar pelos vossos programadores…

Sim. Existe uma luta em todo o lado por bons programadores e existem programadores mesmo muito bons, é uma luta.

Viemos de Tallinn e é bastante pequeno. Tallinn tem muitas mais startups do que Lisboa, sabemos como ir à luta. Estamos preparados.

Que balanço fazem destes primeiros meses em Portugal?

No geral tem sido bom. Tivemos alguns problemas em encontrar o escritório, parece que a indústria imobiliária está a explodir, mas não tem havido muitos edifícios novos nos últimos dez anos, existem muitas empresas a precisar de espaço para escritórios. Foi um pouco difícil encontrar um lugar, agora temos e estamos bastante satisfeitos, é o melhor local para estar, aqui no Saldanha.

Além disso, tem sido muito bom. A atenção dos media tem sido bastante boa, temos participado em eventos, temos contratado excelentes profissionais, estamos muito contentes com as pessoas que encontrámos, a cultura é espetacular, todos são muito prestáveis. Estamos muito satisfeitos com a decisão de vir para aqui, não temos razões de queixa.

A equipa aqui é sobretudo de desenvolvimento e de suporte, mas suspeitamos que também querem fazer negócio em Portugal. Quantos clientes têm no mercado português?

Essa é a parte engraçada. Não temos muitos clientes portugueses, temos bem mais no Brasil quando comparado com Portugal. Melhorou agora que estamos aqui e a atenção mediática também ajudou a arranjar clientes.

Ainda é um mercado bastante pequeno para nós, esperamos que melhore ao longo do tempo.

Quão importante é ou pode ser o mercado português para a Pipedrive? Somos um país pequeno e as oportunidades são menores, mas…

Olhando de forma global e comparando com mercados como os EUA, Brasil e Alemanha, nunca será muito grande. Mas mesmo num mercado pequeno podes destacar-te. Olha para a Estónia, é dez vezes mais pequeno do que Portugal, mas como nos distinguimos temos bons resultados proporcionais, temos muito mais clientes na Estónia do que deveríamos ter.

Espero que o mesmo aconteça em Portugal, onde teremos uma grande quota de mercado, pois estamos aqui, podemos distinguir-nos, é mais fácil num país mais pequeno quando comparado com a Alemanha, por exemplo.

Penso que pode ser bom para nós do lado do negócio, mas como disse antes, estamos focados no mercado global, estamos a tentar ter uma presença forte em todos os países, por isso não fizemos uma grande expansão local em termos de mercados.

Talvez isso mude no futuro, mas por agora temos uma abordagem global – angariar dezenas de milhares de pequenas empresas em todo o mundo e vamos entrando em novos mercados, um a um.

Disse que não têm muitos clientes em Portugal, mas qual é o perfil destas empresas?

Todos os nossos clientes são pequenas e médias empresas. A ferramenta que providenciamos é especificamente feita para essa tipologia de clientes. Portanto diria que a maior parte dos clientes em Portugal são PME.

Existem muitas empresas, não apenas em Portugal, mas em todo o mundo, que estão a vender ferramentas de CRM. Como se diferenciam de todos eles?

Esse foi o caso há sete anos – todos disseram que éramos estúpidos por criar mais uma ferramenta de CRM, pois na altura já existiam centenas delas. O nosso principal elemento diferenciador é o foco.

Não estamos a fornecer uma ferramenta universal para tudo. Estamos focados nas vendas e no modelo de vendas complexas. Se uma empresa está a vender algo que é caro e que demora bastante tempo a fechar, a Pipedrive foi especificamente desenhado para esse processo.

Temos ferramentas para tornar mais eficientes as pessoas de vendas. A maior parte dos nossos concorrentes está a fazer algo que é muito abrangente, é bom para tudo, mas também não é excelente em algo específico. O Pipedrive é excelente naquilo em que é específico.

Quando o começámos a desenvolver em primeiro lugar, todas as ferramentas de vendas eram focadas no gestor dos relatórios e não nas pessoas das vendas. Os vendedores não queriam usar essas ferramentas, mas eram obrigados e por norma usavam algo completamente diferente – post-its, folhas de excel.

Faziam isto ao longo da semana, no final colocavam na ferramenta e lá geravam o relatório. Como deves imaginar, quando usas uma ferramenta uma vez por semana os dados não são muito precisos, os dados são maus. As pessoas depois não conseguem tirar benefício dali.

Quando começámos, queríamos mesmo construir algo que as pessoas das vendas gostassem de utilizar, que as tornasse mais eficientes e que gerasse dados mais valiosos para os gestores. Esta combinação de tornar a ferramenta mais útil e de fornecer melhores dados, é isso que nos torna diferentes.

Podemos ver isso através do crescimento. A maior parte do nosso crescimento ainda vem do passa-a-palavra, as pessoas dos departamentos de vendas estão a dizer a outros vendedores sobre a nossa ferramenta.

A Pipedrive tem sete anos e esse ainda é o caso. Isso mostra que as pessoas gostam da ferramenta, as pessoas falam dela e espalham a palavra. Conseguem sentir o facto de termos colocado bastante amor e esforço na ferramenta, o que a torna bastante útil para eles, em vez de construir apenas mais uma base de dados universal.

Como são uma empresa global, talvez saibam isto melhor do que ninguém. Existem muitas diferenças na forma como os profissionais de diferentes mercados utilizam as ferramentas de CRM?

Sim, tem sido bastante interessante. Suspeitámos que haveria diferenças, mas acontece que os principais conceitos são os mesmos. Claro que se olhares para a Estónia vs. Portugal, os estónios não gostam muito de falar e por isso enviam mais emails. Os portugueses falam mais e fazem mais chamadas.

Mas no fundo é tudo uma conversa entre o vendedor e a pessoa que está a comprar. Existe esta discussão constante e essa discussão passa por algumas fases – podes sempre usar o Pipedrive para monitorizar o processo. Não importa se ligas mais ou se mandas mais mensagens, os conceitos principais são os mesmos.

Não vimos algo verdadeiramente diferente, não tivemos que desenvolver nada específico com base na geografia dos mercados. Da Estónia, aos EUA, ao Brasil, até ao Japão, claro que temos de localizar a aplicação, traduzi-la, mas não tivemos de mudar as funcionalidades por causa dos mercados.

Quais os próximos passos para a Pipedrive? Sabemos que querem contratar mais pessoas, mas se houver algo mais a partilhar, mesmo a nível global, queremos saber.

Queremos expandir a nível global e queremos atacar outros mercados nos quais precisamos mesmo de estar.

Quais são as prioridades?

A Ásia, por exemplo. À maior parte dos outros mercados conseguimos chegar lá de forma global. No Brasil não fizemos lá algo específico, a não ser a localização, mas isso não é suficiente para a Ásia. Tens mesmo de tomar passos extra para entrar nestes mercados.

Os nossos objetivos são as PME e crescer de forma exponencial em termos de número de clientes. Temos mais de 50 mil clientes, queremos ter centenas de milhares de clientes em todo o mundo, queremos ser mais globais.

As Américas e a Europa estão bem cobertas, mas queremos ir para outras partes do mundo. Em termos de escritórios vamos aumentar o escritório de Lisboa, abrimos recentemente um escritório em Londres e esse também vai crescer.

Agora não temos planos para abrir mais escritórios de desenvolvimento, mas haverá um grupo de marketing e de vendas em Londres.

Estão a analisar com muita atenção o mercado asiático. Antes do final do ano vamos ver algum movimento relativamente a essa aposta ou será só em 2018?

Será algo em 2018. Estamos a fazer algumas coisas, mas os grandes movimentos vão acontecer no próximo ano.

Quais foram as receitas da Pipedrive no último ano?

Não posso revelar.

Mas as vossas projeções são de crescimento ou de estabilização?

O plano é duplicar as receitas todos os anos. Temos feito isso há vários anos, vamos fazê-lo este ano, vamos fazê-lo no próximo também.

A nossa definição vem de Paul Graham, na qual uma startup mantém-se uma startup se continua a crescer muito rápido, mesmo que tenhamos sete anos e 300 empregados – ainda nos consideramos uma startup.

O objetivo é crescer 100% ao ano em termos de receitas, esse é o plano.

Durante quanto tempo vão conseguir manter esse ritmo?

Não estou certo. A certa altura os números ficam tão grandes que torna-se difícil crescer ou duplicar a cada ano, mas este ano e no próximo ano isso vai acontecer.

Última questão que me surgiu agora. Têm crescido tanto e tão rápido, não houve propostas de aquisição?

Houve algumas, sim. Não temos muito o espírito de empregados, queremos ser nós a tomar as nossas decisões, queremos manter-nos independentes, ainda há muito para fazer, muito para crescer. Neste momento não estamos a considerar isso.


Publicado em:

Na Primeira Pessoa

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